quarta-feira, 30 de março de 2011

GESTÃO DE EXPECTATIVAS - III -

Dou, de novo, um murro em cima da mesa, gesto não muito politicamente correcto mas que no resguardo da minha privacidade ainda não se tornou proibitivo.
Antes em cima da mesa do que noutra circunstância qualquer:
Magoo a mesa, a mim próprio, eventualmente e se num gesto mal medido, mas não magoo mais ninguém!
Política é a gestão das expectativas ...
E eu sou um bom gestor ...!
Não digo hoje uma coisa e amanhã outra, posso, quanto muito, contradizer-me como contraditória e complexa é a própria realidade que não se resume a soundbites, a frases simplórias ou publicitárias susceptíveis de passarem na comunicação social, delas sempre carentes na gestão implacável daquele que é o seu tempo, um tempo instantâneo e limitado no qual não cabe uma Obra nem mais do que a memória de momentos truncados do dia ou, pedindo muito, da semana anterior ...
Reduzida a essa pressão, à pressão mediática, a História é instantânea, como se o fosse (!), faz-se na hora, é ela própria na presunção que aos média lhes julga, ilegitimamente, assistir.
Nela cabe um golo mas não cabe um concerto de Mozart.
Nela cabe uma gaffe mas não cabe o contraditório.
Nela cabe um boato alcoviteiro, uma especulação que se faça mas não cabe a tragédia de quem dela, anónimo, seja, implícita ou explicitamente, o alvo.
Nela cabe tudo mas não cabe nada!
Eu sou, perdoem-me a imodéstia, um bom gestor de expectativas ...
Há quantos anos, no que escrevo, não deixo sempre um espaço de respiração?
Entrelinhas em aberto que deixem tempo à reflexão?
Silêncios que do que escrevo se anunciam?
Isenção que da falta de juízos de intenções, eles são os bons, eles são os maus (!), me salvaguarda?
Eu sou um bom gestor do tempo que não frustrando expectativas crescem à medida do tempo que passa!
Respondo a quem me escreve, sinal de elementar educação (!) e faço um registo diário daqueles que me visitam sem que daí se possa concluir mais do que isso ...
Não conto espingardas, não arrebanho nem imponho o meu ponto de vista a ninguém.
Sou previsível, cumpro com a palavra dada e em silêncio, decidi-o (!), me quedarei, de novo, daqui até à Páscoa.
Não serei eu a somar ruído ao ruído nem alimento infundadas expectativas e o meu silêncio é tão empenhado como o impulso que me impôs, até aqui, toda esta intensa produtividade!

esta que acabei de escrever, é a Trilogia da Inquietude

Mozart


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 30 de Março de 2011

segunda-feira, 28 de março de 2011

CASA COMUM VERSUS CHAUVINISMOS - II -

O que acabei de escrever focado na Europa, poderia ser aplicado à nossa Casa Comum, o Mundo, o Global no seu conjunto.
O que é que nele deve prevalecer, o Interesse Geral ou aqueles outros interesses nacionais, particulares portanto?
E em que medida é que a construção do edifício democrático global assenta, não no Interesse Geral mas naqueles que são particulares, chauvinistas, nacionais?
E ainda, até que ponto é que estes últimos, os chauvinismos ou os nacionalismos, prevalecem sobre o Interesse Geral, aquele que aos primeiros sobreleva, o interesse da nossa Casa Comum?
Até que ponto é que a construção dos edifícios democráticos, ainda hoje centrados no parcial porque nascidos à volta dos interesses particulares ou das Nações, chocam, conflituam ou não com o Interesse Geral?
E até que ponto é que esse conflito a pode vir a tornar, à construção democrática global, irremediavelmente comprometida?
A esta luz, à luz destas perguntas, também a Europa enquanto laboratório da construção de um espaço geográfico único, enquanto exemplo de criação de uma entidade política que fale a uma só voz pese embora a sua imensa diversidade, constitui exemplo paradigmático dos choques entre o particular e o Geral e de como, quantas vezes, nela prevalece o particular sobre o Geral ou de como conflitua a construção de um edifício democrático único com aqueles outros que, por ora e ainda, assentam nos interesses particulares das suas nações constituintes?
O elencado de perguntas aqui feitas remete para a definição de Interesse Geral:
Até que ponto é que este deve ou não assentar na pessoa humana na sua aspiração à Liberdade como os acontecimentos no Norte de África e no Próximo Oriente, na demonstração desta enquanto valor universal, o vêm, à saciedade e para quem ainda lhe restassem dúvidas, implacavelmente demonstrando!?
Até que ponto é que esta, a Liberdade, é compatível com a Paz!?
E até que ponto é que o anseio de Liberdade, pelos meios pacíficos utilizados sem os quais não há aspiração à Paz possível (!), é compatível com a Democracia!?
Em quem é que ela, a Liberdade, Interesse Geral maior, na sua prossecução política, se revê!?
Numa mescla de interesses particulares ou no indivíduo singular, no cidadão concreto que por ela pugna incansável e sujeitando-se à prova do tempo, interpelando, porque só assim o poderá fazer (!), o próprio sistema democrático ainda assente no particular dos interesses próprios das nações!?
Num compromisso de honra, fiel à palavra dada que aqui transparentemente se expõe e que aos interesses que se revêem na democracia formal, no eleitoralismo quantas vezes de vistas curtas (!), os interpela também!?
Tentando, a outrance, salvaguardar toda a equidistância como câmara de reserva, de silêncio, de bastidores que à Democracia Global, pelo seu aprofundamento, a tonifique!?
Sem a qual, aliás, não há defesa do Interesse Geral que vai sobrelevando sobre tudo o resto como todos os sinais, logo os de ruptura ecológica e ambiental sempre adiados (!), o vão demonstrando!
E aqui, no cidadão concreto e singular, porque ele existe e na sua senda persiste fazendo por compatibilizar, pacificamente, o particular com o geral (!), a semente inadiável da Democracia Global e, logo, do Interesse Geral cada vez mais ingente e tanto mais quanto a aspiração de Liberdade alastra mas que, invariavelmente, pela conflitualidade e no predomínio força, continua a ser sonegado!

num Mundo que se vai tornando, para o bem como para o mal, irremediavelmente irreconhecível, por ocasião de duas Visitas de Estado a Portugal, a do Príncipe de Gales e a de Dilma Rousseff, Presidenta da mais pujante república de língua oficial portuguesa, a terem lugar, ambas, esta semana
 
 
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 28 de Março de 2011

sábado, 12 de março de 2011

OPORTUNISMO VERSUS EUROPEISMO OU DA FALTA DE VERTICALIDADE - I -

( Hoje, dia 14 de Março, passados dois dias sobre a publicação desta página, tão decidido e resiliente como quando escrevo, tomei a decisão de fazer uma pausa para que os meus Destinatários saibam que também ao silêncio e ainda que da escrita o sei fazer, até, pelo menos, à realização do próximo Conselho Europeu marcado para os dias 24 e 25 de Março do mês em curso.
A quem esteja atrasado nas leituras das minhas páginas tem agora uma excelente oportunidade de as pôr em dia já que todas, no fio condutor que as percorre, se mantêm plenas de actualidade. )

Das três uma:
Ou os políticos europeus se continuam a escudar nas instituições europeias remetendo contra elas o ónus quando se trata de implementar, internamente, políticas impopulares e de austeridade tornando-o, ao ideal europeu e à medida que o tempo passa, numa ideia execrável e insusceptível de ser positiva e amplamente sufragado;
Ou os políticos europeus, em função das suas agendas domésticas e da sua densidade específica no quadro europeu quebram, definitivamente, com a ideia da solidariedade sem a qual a Europa se desintegrará, acabando, a batata quente, por lhes queimar, a esses e na falta de equidade, as suas próprias mãos;
Ou, finalmente e no seu vértice, no vértice da Europa, passará a presidi-la a verticalidade que em nome da União, essa ideia maior sem a qual nenhum país europeu poderá concorrer, com sucesso, com os outros espaços geográficos mais ou menos emergentes e à escala planetária, numa Política de verdade, sem hesitações e determinada sendo que, na melhor das hipóteses e na sua ausência, esta, a Europa, acabará como alvo da chacota geral que o é já (!) na tibieza pífia do seu sistema de pesos e contra-pesos internos em desequilíbrio ameaçador e crescente, emperrado e desintegrador a reflectir-se, sem voz única e decidida, imprevisivelmente no concerto das nações!
Pela diversidade cultural que à Europa a caracteriza, desequilíbrio desintegrador, inclusivé, de qualquer ideia efectiva de solidariedade global e da Paz que tarda!
O resto é conversa fiada e brincar literalmente com o fogo!

ainda e com um continuado aperto no coração

enquanto nas ruas se manifesta a indignação e a esperança

Haydn

Jaime Latino Ferreira
Estoril, 12 de Março de 2011


sexta-feira, 11 de março de 2011

PRECARIEDADE

Sounak, The Game

Num jogo, a omissão de uma das suas peças na disposição que estas ocupam no tabuleiro, retirar-lhe-ia, por ventura e por completo, o sentido revelando-as em toda a sua imensa precariedade


A precariedade começa na leviandade com que se utiliza a palavra.
Leviandade, incoerência, inconsistência.
Há coisas que se dizem e que ou são ou não são para fazer valer:
Quando, como o fez o Presidente Cavaco Silva no discurso da Sua tomada de posse, se afirma que a pessoa humana tem de estar no centro da acção política ou que essa pessoa não é uma estatística abstracta, o que se está, verdadeiramente, a querer dizer com isto?
E tanto mais quanto a pessoa que se afirma, determinada e correcta, democrática e persistente, resiliente o for perante essa mesma acção política?
Respondendo a ela com aprofundada acção política?
E na juventude que saiba encarnar?
Na expectativa que essa mesma acção política crie e que não é para ser frustrada nem, tão pouco, omitida?
Ou é?
Há vinte e dois anos que, em resposta a um apelo veemente ao aprofundamento da Democracia do então Presidente Mário Soares, Lhe respondi à chamada e, de então para cá, não deixei mais de corresponder nesse sentido até que, chegados a hoje, duas décadas e cinco mandatos volvidos oiço estas palavras da boca do Seu sucessor, na Sua tomada de posse, repito e interrogo-me:
Onde está a coerência, a consistência, a congruência no discurso!?
E que precariedade, insegurança a sua eventual falta, na minha própria omissão, volvido tanto tempo numa Obra que se ergue, não cria!?
E o que é que é para valer, a palavra da força ou a força da palavra!?
A força da palavra que ao encontro desse já então veemente apelo, expondo-me, numa incansável prova a estender-se no tempo, não parei mais, até aqui, de desenvolver!?
Que adesão com a realidade tem esse, têm esses dois discursos políticos na omissão da pessoa humana, alvo central que da acção política aprofundada tem de ser!?
A precariedade começa, reside logo na leviandade com que se utilize a palavra e ela cava precariedade sobre precariedade!
Precariedade que vai deixando gerações e gerações num imenso sufoco ...
... à rasca como parafraseando se dirá!
Gerações que ainda agora, algumas delas, mal começam a dar os seus primeiros passos!
Pelo contrário, a firmeza nos princípios e a coerência na acção, falo por mim, essas só podem gerar confiança e segurança adicionais e por mais conturbados que sejam os tempos que transcorram ...
... que o são!

sobressalto cívico seria se a pessoa humana, pelo seu provado mérito mais do que porque escudada numa qualquer manifestação pública de maior ou menor impacto e ainda que pela justa indignação contra a precariedade e por mais ou menos jovem que o fosse, se pudesse, enraizada, rever no poder político democrático pelo reconhecimento que este, pela sua acção e determinado, exercendo a reciprocidade, lhe viesse a emprestar


com o Japão no coração


La Nicolina


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 11 de Março de 2011

quarta-feira, 9 de março de 2011

HOJE

Hoje faço silêncio

Um silêncio assim entremeado de contornos

Cada contorno uma letra
uma palavra
um verso
uma estrofe
um período

Um período que a outros se sucede e já viu passar este
aquele e aquele outro
inquilinos de uma cadeira que me ficaram sempre por responder

directos
e a cujo silêncio respondo adensando-o de contornos sempre e mais

Como se dissesse presente sem desmobilizar
a prospectiva que por cada texto responde sempre à chamada
como se fosse essa a última
a primeira
a única vez

Hoje fico a ouvir a chamada
em busca de um sinal de coerência que se paute não pela palavra da força mas pela força da palavra

A força que esteja
não na quantidade que a suporte
ainda e só
sempre simulacro de guerra ou de contenda
mas sim na qualidade que
nela mesma
no seu nexo resida

E no silêncio me quedo e escuto
aguardo e apresto-me ao que dela se vier a sugerir

Hoje faço
uma vez mais
silêncio


numa tomada de posse


Canção para Canto Solo


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 9 de Março de 2011

terça-feira, 8 de março de 2011

GARROTE - II -

João de Azevedo, Garrote

Tal como na página anterior, onde em aparente fuga em frente e sem supesar cegueiras nem constrangimentos fazia a apologia da grandiosidade das culturas na matriz linguística que as molda e que a todas as deve colocar em pé de igualdade e tanto mais quanto a globalização à diversidade faz simultâneo apelo, agora, preso ao garrote que nos constrange, em aparente dualidade maníaco-depressiva, deixo-me tomar por não menor aparente asfixia que do seu progressivo aperto, a todos e às culturas nos parece tomar de assalto:
Ameaças de guerras civis que se acentuam e onde a mulher e a criança são delas o seu elo fraco;
Avalanches de refugiados que crescem e pressionam a comunidade internacional;
A crise das dívidas soberanas;
A aparente neutralização das instituições supra-nacionais;
A sistemática quebra do Contracto Social;
A subida galopante dos preços das matérias primas;
O agravamento acentuado do custo de vida;
O desemprego que não pára de crescer;
Juros, impostos, asfixia;
A inflacção, esse monstro que, de novo, ameaçador se perfila ...
( ... )
E tudo à uma!
Onde iremos parar!?
Num aperto ... quem está num aperto!?
Eu escrevo por mim:
Sempre fui um precário e que me restará esperar senão continuar a sê-lo!?
Pelo menos, não perdi a minha independência!
A capacidade que tenho, pese embora a factura que ao longo dos anos vou pagando e que já por mais de uma vez me foi cobrada, de não me deixar tolher pelo medo que uma situação contratual, adicionalmente, sempre nos cria e que nos condiciona e compromete!
Saberão, as novas gerações ou o festival da canção travestido em nacional cançonetismo de intervenção, o que é estar, verdadeiramente, num aperto sem perder, desde há muito (!), a capacidade de indignação!?
Sem perder, tão pouco, a dignidade e a compostura a que a tentação pela facilidade sempre alicia!?
E que aqui, neste meu blogue, se vai, paulatinamente e sem hesitações, expondo!?
E finalmente:
Sem perder a capacidade de discernimento de à Democracia e logo a representativa a salvaguardar de todas as ondas e tentações demagógicas e populistas que nestas alturas sempre proliferam ameaçando-a, como outrora, quando à precaridade se somava precaridade, de por em causa!
Num aperto ...!
Sede bem vindos ao mundo real!

no Dia Internacional da Mulher quando estar num aperto é está-lo desde há já muito tempo como a mulher na sua condição bem o sabe, sem vacilações nem quebra de independência nem, tão pouco, da capacidade de indignação


Concerto de Samuel Barber


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 8 de Março de 2011

segunda-feira, 7 de março de 2011

A GRANDEZA DA LÍNGUA - I -

Brueghel, Torre de Babel

Varia a grandeza de uma língua em função daquela que se fale, escreva ou leia?
Vale mais, tanto ou menos este meu blogue por ser escrito em português e não numa outra língua qualquer?
Que universalidade tem a música que uma língua, qualquer que ela seja, a não possa ter também?
Que dimensão, que grandeza tem a língua?
Vale, aquilo que escrevo, mais, tanto ou menos do que se fosse escrito, por exemplo, em inglês?
Ver-me-ei, como cidadão do mundo, diminuído por escrever em português?
Diminuído, equiparado ou, particularmente, valorizado?
Por tal deverei ser, de facto, penalizado, ao invés, valorizado ou tido por um entre pares?
Será a língua um obstáculo ao exercício em pé de igualdade da cidadania global?
Terá, no contexto das nações, um cidadão português os mesmos direitos de um outro espanhol, francês, alemão, russo ou chinês?
Ou terá um cidadão guineense, por exemplo e falante de um qualquer crioulo, os mesmos direitos que eu tenho, mais ou menos?
A todas as perguntas que aqui faço, grosso modo, ele há uma maneira politicamente correcta e previsível de responder que as próprias perguntas sugerem, uma outra que se escude nas assimetrias que existem para justificar, do ponto de vista resignado e da demissão dos princípios, uma desigualdade de facto e uma terceira que, corroborando pela negativa o implícito nas próprias perguntas, confessa o inconfessável.
À terceira forma de responder, nem lhe dou guarida!
À segunda, a essa, considero-a desculpa esfarrapada de mau pagador ...
... pagador ou cobrador!?
Quanto à primeira forma de responder, pois se somos todos iguais então, que o sejamos de facto ...
... na dimensão, grandeza universal que, afinal, no cosmopolitismo global, qualquer língua ou cidadão têm de ter!
Repare-se que escrevo sobre dimensão, grandeza e não sobre projecção da língua e logo do cidadão que a domina.
Na globalização imparável que implica a salvaguarda das diversidades, logo das linguísticas (!), aja-se, então, em conformidade sob pena de haver culturas de primeira e outras de segunda ou de terceira grandezas!
E o meu ponto é este:
Sem princípios, no caso aquele que a todos nos coloca em pé de igualdade e independentemente da língua que falemos, não se vai a parte alguma e a globalização não passará de um embuste!

do valor universal das línguas


Concerto de Samuel Barber


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 7 de Março de 2011

domingo, 6 de março de 2011

PINGO

De tanto pingar
o pingo cava
um caminho

carreiro
riacho
ladeira
um vaso
um ancinho

que grava na terra
a escrita a que vai
um desenho

um traço
destino
fio de água
uma mágoa

de antanho

é lágrima solta
que chora
nascente revolta

tinta
gravura
moldura
uma máscara
perdura

o pingo convida
ao choro que cheio
transborda

tinteiro
isqueiro
vespeiro
de um voo
que interroga

pingo palavra
poema que lavra
uma trova

e o pingo
insiste
resiste
persiste
namora

do que te riste
não sabes nem nada
nem viste
que o pingo
que ouviste
é mais
muito mais
porque quis-te


pingo de uma lágrima só


Rain Pearls


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 6 de Março de 2011

sábado, 5 de março de 2011

PALAVRA E POLÍTICA

Steven Millman, Boat Reflections #2

Quem pense que a palavra, em si mesma, não tem impacto político está, redondamente, equivocado!
Ela é, pode ser, em si mesma, um facto político incontornável:
Pela sua abrangência, isto é, pela sua capacidade interpretativa;
Pela profundidade em que se adense;
Pelo contraditório que, em si mesma, encerre.
Um facto político não se mede, apenas, pelo impacto social em que se traduza;
Na sua capacidade mobilizadora;
Nos reflexos institucionais em que esta, a capacidade mobilizadora, se projecte e venha a traduzir.
Não!
A palavra, na reflexividade que saiba espelhar e que a prazo não deixa, em si mesma, sendo impactante, de mobilizar e de se projectar com reflexos, eles também, institucionais, na arte do seu manejo, pode tornar-se, ela própria, num facto político que, sendo impossível de contornar, na contradita que encerra, aprofunda, essa sim e qualitativamente a Democracia que é muito mais do que o formal de que se possa e deva, convenhamos, revestir.
Por outras palavras:
Não há sistema de representação democrático sem adesão expressa, sufrágio secreto e universal que lhe dê legitimidade, mas este fica manco, fragilizado se a essa adesão lhe não for somada a fundamentação que pela palavra no indivíduo, seu último propósito e agente, se centre e que alicerçada no tempo se baseie para lá de toda a estatística, instantaneidade e capacidade, de per si, mobilizadora.
Ou melhor, para que a capacidade mobilizadora, nessa catarse que pelo poder que na palavra reside e no indivíduo se realiza, se possa, verdadeiramente, exponenciar!
Para que o um se reveja no todo mas o todo também no um, realizando, deste modo, o aprofundamento político e cabal, fortalecido, rejuvenescido da Democracia.

sem o aprofundamento que na palavra reside, não há alicerce democrático sustentável


Let me dwell


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 5 de Março de 2011

sexta-feira, 4 de março de 2011

ACAUTELA-TE


Acautela-te pimpinela
enquanto o pau vai e vem
não folgues pois te interpela
o que aqui escrevo por cem

À minha palavra convém
tê-la em conta pois ela
é um
chuchu que por bem
não te rasteira a canela

É cor de cor paralela
cor sem medo de querela
não te indisponhas com quem

Tem paciência se tem
de
S. Bento até Belém
flor que trago à lapela


Time stands


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 4 de Março de 2011

quarta-feira, 2 de março de 2011

CRISE VERSUS CRISE

Entalados entre duas crises, a económico-financeira ou a da chamada dívida soberana por um lado e a de representação política por outro, os estados democráticos debatem-se num dilema diante do qual não há fortalezas (!), por muito que se queiram iludir, que os resguardem:
A Norte é o contracto social que se vê, permanentemente, posto em causa;
A Sul são as novas ferramentas que ao indivíduo conferem soberania amplificada derrubando ditaduras que se julgariam sólidas, que às instituições as fazem desmoronar abrindo um vazio sem precedentes e que à própria Democracia, na sua solidez, a desafiam.
Ameaçados de contágio por uma e por outra via, pela económico-financeira e pela de representação política, os estados democráticos hesitam entre a contabilidade estrita e as derivas resultantes do incontornável, porque ele está aí (!), aprofundamento da própria Democracia de resultados, quiçá (!?), imponderáveis.
A crise que avassala, por ora ainda e só (?), o Norte de África e o Próximo Oriente é a crise de representação que os estados democráticos não sabem ou fingem não saber até que ponto os põe, os ameaça de por em causa no estrito pragmatismo que os tem orientado externamente, não poderão deixar de viver sem ele (!) mas que às suas próprias debilidades intrínsecas as não deixam de cavar, fragilizando-os!
Onde deverá conduzir o aprofundamento da Democracia?
Onde deverá conduzir a sanidade das finanças públicas?
Se a primeira não poderá fazer tábua rasa do indivíduo soberano nas provas de fidelidade que à Democracia e no tempo, este preste e delas dê provas independentemente da dimensão política mais ou menos amplificada em que elas se traduzam, a segunda, sendo, ela também, incontornável, não se poderá, tão pouco, realizar à sua própria custa.
O dilema é sério, a crise não pára de se cavar e não adianta protelar no tempo o que se vai tornando insofismável e por demais, por estas duas vias, tremenda e quasi incontrolavelmente contagioso!


entre o indivíduo e a História


Handsome or Torture


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 2 de Março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

DIA APÓS DIA

François Casanova, Burning bush

Não me comentes a mim nem digas nada
para quê se tudo o que digas não me entrava
comenta antes por mim ao que aqui escrevo
nas linhas e entre-linhas a que me atrevo

Não passes em branco a nada nem ao meu nervo
a essa tensão que o leva a escrever devo
dizer aquilo que escrevo brotando lava
que jorra incandescente como magma

Que importa o que disseras a este servo
que da palavra a faz a sua albarda
sela onde carrego a minha enxada

Importa sim que a escutes no que traga
consigo bem escondida naquilo que prego
assim cuidando dela e com que te rego


Meltdown


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 1 de Março de 2011