AO DECANO DOS POLÍTICOS DEMOCRÁTICOS
Caríssimo,
Depois da entrevista por Si dada a um canal privado de televisão na passada terça-feira, tomei a decisão de Lhe escrever esta a que decidi chamar Carta Em Três Pontos.
1 – o carisma dos que foram
Queixa-se o Meu Caro Amigo da suposta falta de estatura dos políticos no activo sobretudo se os comparando com outros que foram Seus contemporâneos, lembro-me de o ouvir referir, entre outros e se não estou em erro, Mitterrand, Willy Brandt, Helmut Schmidt ou Harold Wilson, imputando a esse défice ou ausência de carisma o actual impasse europeu mas, interrogo-me:
Se os actuais líderes europeus fossem portadores do carisma dos políticos que nomeou e que eu nem sei mesmo se não corresponderá antes à imagem que hoje deles se faz, a memória tem destas coisas fazendo crescer ou diminuir a aura daqueles que o não são mais, mas ainda que tivesse razão, no actual contexto que não é aquele em que eles exerceram, a ser como diz, concorreria ou não esse carisma para a resolução do impasse europeu!?
É que, bem vê, se eram mais carismáticos, mais empenhados então estariam na representação e defesa das clientelas que os elegeram contra as demais, cavando o impasse que nos fez chegar até aqui e que nos angustia …
Falar-se desse hipotético défice de estatura torna-se, portanto, num puro exercício de especulação retórica …!
2 – as respostas que até hoje não recebi
Já de especulação não se trata se me referir a Si na Sua relação comigo próprio.
Conhecemo-nos vagamente e eu próprio cheguei a ser por Si recebido, em Sua casa, nos idos do PREC.
Posteriormente, escrevi-lhe em resposta a um apelo por Si feito na Assembleia da República, à data da comemoração do décimo quinto aniversário da Revolução de Abril, apelo esse em que o meu Amigo, então no exercício do mais alto cargo da magistratura, dramaticamente, interpelava ao aprofundamento da Democracia.
Fundamentei a resposta que Lhe dei e a essa primeira trilogia de cartas muitas e muitas outras se lhe seguiram e que indirectamente sei estarem hoje depositadas no Arquivo da Presidência da República.
De Sua boca ou por Sua mão, porém, nenhuma resposta ou justificação directa às minhas cartas, até hoje a recebi …
Devo, daí, concluir que o meu Amigo não tem estatura ou carisma?
Não, não tiro essa conclusão mas, no entanto, nunca até hoje me respondeu deixando-nos a nós, a Si como a mim mesmo, num aparente impasse ou dúvida que até aqui não se resolveu!
Repare que estamos, neste particular, não a falar do impasse europeu mas daquele que se resume à relação entre Si e mim, nem mais do que isso e se esse impasse, o impasse entre duas pessoas, não é resolúvel, onde ir buscar a vontade para resolver o impasse europeu!?
3 – a assumpção da política
É de louvar e tanto mais quanto nos tempos que correm, a Sua frontal assumpção como Político e não o escrevi em vão com maiúscula por que sei que o é até por Consigo me identificar como corredor de fundo que sei que o meu Amigo também é e pese embora, hoje, o meu Amigo já não desempenhar nenhum cargo de natureza política.
Quando os políticos, na boca do mundo, se encontram pelas ruas da amargura, haver quem como o meu Amigo se assume assim, tem um redobrado mérito que sem regatear lhe reconheço e não apenas pelo Seu currículo estritamente político.
Agora eu também sou um Político e escrevo-o igualmente com maiúscula não porque alguma vez tenha desempenhado um cargo dessa natureza mas por o ser intimamente, tão intimamente quanto sei, como o meu Amigo o sabe, que sem Política, sem a perspectiva ou prospectiva política das coisas não se vai a lado nenhum!
Corredor de fundo!?
Sim, sou-o também, tão de fundo quanto, calcule, ainda hoje aguardo uma resposta a tudo aquilo que desde essa trilogia de cartas que Lhe escrevi e na plena posse da minha consciência que ainda hoje me diz que sem elas como matriz e força motriz, não permaneceria escrevendo assim como continuo a fazê-lo e mantendo toda a expectativa em aberto, tanta como quando então eu Lhe escrevi pela primeira vez e mesmo se ficando, até hoje, sem ter resposta.
Já viu a capacidade que tenho em correr, já lá vão mais de vinte e dois anos e pese embora a ausência de respostas para mais em Democracia, é bom que se frise (!), sem nunca Lhe deixar de conceder o benefício da dúvida …?
Que me diz, o meu Amigo, deste meu carisma político que, para mais, não está refém de interesses nem de clientelas que não sejam o interesse geral do aprofundamento da própria Democracia!?
Com todo o respeito, afinal, quem corre mais, o velho leão ou o maratonista?
Seu e com toda a consideração
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 1 de Dezembro de 2011