quarta-feira, 3 de abril de 2013

PARA UM DESTINATÁRIO LONGÍNQUO MAS CADA VEZ MAIS PRÓXIMO


Templo do Céu, Beijing


AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA



Excelência, Camarada Xi Jinping,

Embora tardiamente, mais vale tarde do que nunca costumamos nós dizer e aproveitando o ensejo para felicitá-Lo pela recente nomeação como Presidente da República Popular da China desejando-Lhe todas as felicidades, queria, nesta oportunidade, refletir Consigo a partir das linhas de força que, aqui, nesta minha reflexão que desejaria partilhada, Lhe sugiro.

As ideologias que não professam Deus, ao não professa-Lo, logo, Nele não acreditando assentes em mundividências integristas, isto é, apegadas exacerbadamente a princípios e dogmas, não deixam de ser confissões.
Aquelas que Nele não acreditando se revelam, portanto, confissões que professam acreditarem em Nele não acreditar.
Constituindo-se em poder não salvaguardando os seus limites, imiscuindo-se, portanto, na esfera confessional ou naquela do poder intemporal ou com ele confundindo-se tornam-se, assim e ainda que simetricamente, em estados confessionais.
Há-os desta natureza, confessionais ateus, mais ou menos mitigados.
Nuns casos, idolatrando de tal forma os seus líderes que equivalem a monarquias mais do que absolutas e teocráticas.
Noutros casos, mais mitigados, interferindo diretamente na escolha dos representantes religiosos de que religiões o forem e mantendo-as sob sua estreita alçada.
Em todos eles, seguramente, revelando uma insegurança, receios mais ou menos extremados do vírus de Deus ou do, assim chamado e ainda que apenas ideologicamente latente, ópio do povo.
Tanta insegurança quanto o receio dos estados confessionais religiosos, propriamente ditos, pelo contágio do ateísmo ou da suposta dissolução dos costumes que, abrindo mão dessa sua prerrogativa confessional, desencadeariam.
Em ambos os casos, repito e pela insegurança que revelam, descrendo, afinal e por isso mesmo, na força das mundividências que professam.

Eu acredito em Deus.
Tal facto, porém, em nada me leva a recear daqueles que Nele não acreditam.
Mais, acho que têm pleno direito a Nele não acreditarem sem que os meus fundamentos sejam, por isso, abalados.
Eu próprio que já professei o ateísmo, nele incluído o comunismo e como me lembro da fé inabalável que por ele me fazia mover reconheço que, muitas vezes, estes, os comunistas, acreditam e fazem mais por um futuro melhor do que muitos crentes resignados, não conformados mas antes resignados, que nada fazem pela prosperidade futura.
Eu acredito, Tu não e depois?
O que nos impede de conjugarmos esforços por um futuro de paz mais sorridente para todos?
As nossas convicções mais íntimas?
Mais íntimas, ora aí está, que direito me assiste a mim ou a Ti de as impormos, condicionarmos ou interditarmos a terceiros?
Tal revelar-se-ia, aliás e julgo que o partilhará comigo, uma impraticável possibilidade.

Que problema existe na laicização do Estado?
Sim, porque a laicização do Estado implica que este também se despoje de roupagens ideológicas.
Que medo no reconhecimento da separação de poderes replicando, afinal, qual negativo fotográfico, receios antigos e tentações de que as religiões foram ou continuam a ser tomadas revelando, repito, uma profunda descrença nas suas próprias convicções?
Eu acredito em Deus e Tu no paraíso na terra e depois?
Prefiro valorizar o que nos une, a vontade comum de bem e melhor fazer.
Aquilo que não vale é Tu impores-me o que eu, a Ti, não te imponho e o Estado, esse, deveria estar acima dessas nossas idiossincrasias sob pena de vir a transformar a Terra não num paraíso mas num autêntico inferno inquisitorial para todos como, aliás, a experiência histórica nos ensina.
Nada como a liberdade confessional da crença nela incluída a crença de a não ter!

Um país, dois sistemas.
Como, hoje, ainda me ressoa a palavra de ordem lançada pelo Vosso predecessor Deng Xiaoping e que explica o boom que a China, de então para cá, tão prodigiosamente conheceu!
Um país, dois sistemas ou, numa linguagem que a nós nos é mais familiar, um país e dois setores, o público e o privado.
O público ou aquele que o Partido Comunista da China ocupa, o privado ou o da economia de mercado e da propriedade privada.
Que monumental salto em frente!
Como gostaria de revisitar uma China que já não é senão a sombra, luz daquilo que era.
E como desse salto em frente, ao contrário de outros que ficaram amarrados a dogmas e clichés, um pequeno passo apenas falta, o da esfera íntima ou singular que a propriedade privada faz desabrochar, para desatar nós e desimpedir constrangimentos que bloqueiam a sociedade que, tal como a nossa mas pela inversa ameaçam as perspetivas de desenvolvimento futuro.
As perspetivas de desenvolvimento entendendo-se este como pacífico e cada vez mais exponencial sob pena de estarmos na iminência de uma monumental rutura de dimensões catastróficas para não dizer apocalípticas.
Um país, dois sistemas!
Como cheguei a sonhar aprender a jogar bridge, imagine, com Deng Xiaoping.
Como Vos admiro nos passos que destes.
Tal como escrevi ao Papa Francisco, falta o quase para a coragem que falta!

Se o meu Amigo tiver disponibilidade e a esta minha carta lhe juntar a leitura dos três textos que neste meu blogue a esta a precedem, Ao Papa E Em Nome Próprio, Ponto De Equilíbrio e Fundamentação, aliás, em linha com esta carta que a Si Lhe escrevo, ficar-lhe-ia muito grato.
Não sou de ter duas caras, a realidade é que é, tanto numa como noutra perspetiva, bem mais complexa do que, à primeira vista, a preto e branco, quantas vezes, a mim me incluindo, eventualmente, na tentação de assim a ver, nos poderá parecer.

Com as minhas mais cordiais saudações, felicitando-O uma vez mais, Vosso e com toda a estima


se o comunismo, saltando escusadas etapas, aprendesse com o cristianismo que, afinal, também o enforma, todos teríamos a beneficiar muito com isso



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 3 de Abril de 2013
interior do Templo do Céu, Beijing



3 comentários:

manuela baptista disse...

eu diria

que todos os esforços para direcionar o entendimento entre as confissões, são mui valiosos

e jogar por jogar,

preferia o mahjong e as suas pedras de honra

Jaime Latino Ferreira disse...

MANUELA BAPTISTA


Minha Querida,

De acordo mas, Mahjong, mais ou menos, já nós sabemos jogar enquanto bridge, nem tu, nem eu!


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 5 de Abril de 2013

ki.ti disse...

e o gato e o rato?

muito mais divertido