sábado, 19 de outubro de 2013

ANGOLA E PORTUGAL








Começo este meu texto por uma justificação:
Se escrevi o seu título por esta e não pela ordem inversa não foi por utilizar como critério a colocação dos respetivos países respeitando a ordem alfabética mas antes porque sendo eu português, facto sobre o qual se torna escusado especular, teria de ter uma qualquer nacionalidade, a cortesia e já para não falar do respeito protocolar, nunca uma qualquer subalternidade vis-à-vis seja que país for, me obrigam a colocar Angola, o país terceiro e não Portugal, em primeiro lugar.
Dado este esclarecimento, passemos ao que me traz até vós.

Salvo erro, nunca escrevi sobre Angola ou sobre as relações deste país com Portugal.
Nunca o fiz por variadíssimas razões mas, sobretudo, porque, pese embora o desconhecimento cultural que dele tenho, confesso-o, se tratarem de países tão próximos e de relações tão demasiado quentes, apaixonadas, à flor da pele ou temperamentais que tão rapidamente fervem como se distendem quais irmãos recém-separados mas de recordações e feridas ainda demasiado frescas prontas a bulir por tudo e nada.
O mesmo poderia também acrescentar em relação a todos os países lusófonos tais como Angola o é, isto é, aqueles que partilham uma mesma língua, o português e nunca o fiz, não por desconsideração por quais fossem mas talvez antes e ao invés, pela consideração resultante da partilha desse território que é a língua comum.

Relações entre os Estados angolano e português e relações entre os respetivos povos.
Umas e outras não se confundem embora ambas se rejam, como tudo, aliás, por interesses e umas possam potenciar as outras.
As relações Estado a Estado desenvolvem-se de acordo com um quadro de prioridades que estes, os estados, entre si, bilateralmente estabelecem.
As relações entre os respetivos povos desenvolvem-se de acordo com uma rede pluridimensional de interesses tanto mais vasta quanto a relação umbilical existente entre eles e que se espraiam muito para lá das prioridades definidas pelos estados e que estes têm tanta maior dificuldade em enquadrar quanta a proximidade entre os seus respetivos povos.

Na minha ignorância julgo, no entanto, e só vos peço que me corrijam se estiver equivocado, que o Estado democrático português nunca pediu oficialmente desculpas pelo jugo que a esses povos e ao angolano em particular, no passado os sujeitou e tal, reconheço-o, a ter sido assim não consigo compreender.
A História é a História, bem o sabemos, ela não pode ser reescrita mas o que teria impedido o Estado português, democratizando-se e, logo, mudando a sua natureza e em nome da verdade histórica e do reforço das relações bilaterais, passados já tantos anos, de o fazer?
A consideração devida aos ex-colonos que de um momento para o outro e com uma mão à frente e outra atrás, o Estado português se viu obrigado a reintegrar sendo certo que sobre eles não deveria, como poderia na altura tal acontecer (?), genericamente, ter recaído qualquer anátema?
A consideração que Portugal deve aos seus ex-combatentes?
A consideração pelo papel das suas Forças Armadas?
Em que é que estes, Forças Armadas como ex-combatentes, com esse pedido de desculpas poderiam, alguma vez, ser abalados?
Talvez que neste particular eu esteja particularmente à vontade para escrever:
Em vésperas do 25 de Abril de 1974, por motivos políticos, tinha sido suspenso da escola onde estudava e encontrava-me perante o dilacerante dilema de ser alistado para a guerra colonial ou desertar.
Veio o 25 de Abril que me poupou, com a mais feliz das oportunidades, de fazer essa dolorosíssima opção e, logo, compulsivamente, passei à reserva territorial pelo que nunca fui alistado embora tenha todo o respeito pelas forças armadas e pelos que por elas combateram sem os quais uma nação não se sustenta.
Dolorosíssima opção porque desertar e, logo, desenraizar-me, mais a mais nessas circunstâncias, teria sido muito penoso tal como ser alistado para a guerra não o teria sido menos.
Uns e outros, combatentes como desertores políticos tal como os exércitos, cumpriram os seus deveres em função das suas consciências e da sua missão e a sua coragem, com um pedido de desculpas, não me parece que pudesse, alguma vez, ser questionada.
Agora, o Estado angolano é como é, o português tal como o é e as relações entre estados ultrapassam tudo isso.

Reconheço ainda que entre os meus patrícios cresce a ideia que consiste em se achar que estamos a ser tomados pelos angolanos e nela não posso deixar de vislumbrar um certo ressentimento, ressabiamento mesmo e isto para não dizer pior, de quem agora se sente de mão estendida e tanto mais quanto, ironia das ironias, em relação à potência outrora colonizada.
Os angolanos têm todo o direito em levantar a cabeça, a enriquecerem de nos fazer inveja, a investirem onde muito bem entenderem e desde que legitimamente e sobre eles, genericamente, não pode prevalecer a suspeição.
É, só pode ser, um motivo de alegria para todos nós, tanta quanto de tristeza mas não menos de inconformismo a situação porque que Portugal passa.
Reconheço ainda que a salvaguarda do segredo de justiça é o que é e que, às vezes mesmo, parece uma anedota.
Agora, tudo o que foi dito para trás não pode obstruir a Justiça nem esta, no seu decurso, pode ser motivo para um qualquer pedido de desculpas a terceiras partes, com que fundamento (?) e ela tem de fazer o seu caminho independentemente dos visados ou da própria obstrução em que a violação do segredo de justiça, quantas vezes e objetivamente, resulta o que, em nome da separação de poderes, não responsabiliza, diga-se, que Estado for.
Há desculpas e desculpas!




um prevaricador é um prevaricador onde quer que esteja e onde quer que vá e ele não lança um anátema sobre qual seja o seu povo de origem






Jaime Latino Ferreira

Estoril, 19 de Outubro de 2013



4 comentários:

. intemporal . disse...

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. "prontas a bulir por tudo e nada." . são as relações que emergem de um volte.face . que se pensa existir . e verificar .

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. se por um lado temos Angola com recursos que parecem dar fruto . mas que também sustentam as origens prevaricadoras . onde a esmagadora maioria do Povo se encontra submissa a um regime . que não comento . por outro temos o Portugal de há tanto . não de sempre . mas de há tanto . de rabinho entre.as.pernas e a língua estendida . a qual se presta servilmente às vontades de outrem .

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. abraço.O .

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Kika disse...

Kriu?

Tão fácil, Jaime:

de Angola, eu!
de Portugal, tu!

Daaaaaaaaaaaaaaa! Porque complicas tanto?

Kriu!

Anónimo disse...

Eu também fui suspenso da escola onde estudava, porque dentro do manual de "Moral e Religião", tinha esta beldade de Albano Neves e Sousa...

Tempos "rijinhos" aqueles :-)

Fica bem, patrício meu!

manuela baptista disse...

muito bem!

e se existem processos, pois que os levem atá ao fim, imparcialmente, sendo os suspeitos de cá ou de lá, ou amigos seja de quem for