Jackson Pollock
Senhor Empresário,
Escrevo-lhe em desespero de causa e interpelo-o sobre o que é que os parafusos têm a mais que as palavras, na sua musicalidade, não tenham!?
Em que é que estes contribuem a mais na criação de riqueza de que as palavras estejam desprovidas!?
Em que é que estes, na sua fábrica de ponta, fazendo a ela confluir a nata das classes dirigentes, as dispensa, por outro lado, de às palavras darem a devida, igual ou maior atenção!?
Dirigentes que, tanto para o bem como para o mal, as não dispensam, entenda-se!
Eu bem sei que os parafusos, ainda nos dias que correm, são indispensáveis tanto ao hard como ao software, que empregam talvez milhares ... milhões de pessoas, que se exportam aos magotes e que concorrem, por isso e numa simples operação contabilística para o produto interno bruto das nações mas, e as palavras, são elas, porventura, mais dispensáveis!?
Devem ser elas atiradas para um limbo a que, eufemisticamente, se chama de cultura sempre carente da atenção que apenas um último louvor, qual extrema unção, devessem merecer!?
Eu bem sei que os parafusos servem para apertar muita junta, ligar as partes que se constituem num corpo material sem os quais este não se manteria de pé nem poderia ser transaccionado e mesmo que desmontado mas, e as palavras!?
Que seria da sua empresa sem elas!?
Até à linha final de produção e aos entrepostos de revenda!?
O que elas unem, apertam, juntam, aparafusam e alicerçam!?
Como elas contribuem ou não (!) para a coesão de um grupo!?
Palavras que, tantas vezes, são utilizadas sem qualquer critério ou musicalidade ...!
Como aquele discurso que, pertencendo a outro, por erro, um alto dignitário começou a ler numa arena internacional e que nem sequer, por si mesmo e qual colegial, ao lapso o ter sido capaz de detectar ...
... e sem tão pouco, no acto, se ter feito acompanhar por um simples pedido público de desculpas em relação ao seu homólogo, em relação àquela arena e em relação ao seu próprio Povo!?
Como são importantes as palavras, quando utilizadas com critério, na sua empresa, na sociedade, no Mundo em geral!
Como elas contribuem para a riqueza cultural e, logo, geral dos povos ...!
Senhor Empresário,
Tire os parafusos do produto a que se destinam e o que será dele!?
Ou vejam-se as suas partes deles dispensadas e o que será do Senhor!?
Mas ver-se-á, o meu Amigo, alguma vez, dispensado das palavras!?
Habituamo-nos a conviver com as coisas, somos incapazes de dispensar as palavras que a bem dizer são mais do que coisas, mais do que parafusos que indispensáveis, por ora, ainda o são (!), elas povoam o nosso imaginário virtualmente por elas aparafusado, aquele mesmo que o fez erguer a sua empresa, mas quer isso dizer que por nos povoarem se troquem a pataco, mais do que em saldo, sem qualquer valor!?
Vem esta carta a propósito de Lhe pedir um simples favor:
Quando algum dos nossos impertinentes dirigentes, sempre com a boca cheia de palavras (!), o for visitar, agradecia-Lhe muito que lhe perguntasse porque é que ainda não me veio visitar a mim!
Seu e, afianço-Lhe (!), com os parafusos todos no lugar
em memória do meu avô Latino, comerciante de ferragens e revendedor de ... parafusos
Suite
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 14 de Fevereiro de 2011