sexta-feira, 4 de maio de 2012

E AINDA

de um cartaz alusivo ao Dia Internacional da Mulher, Jornadas do Parlamento Europeu, 8 de Março de 2012


( … ) tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil e preciso de as reunir; elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só Pastor. ( … ) do Evangelho segundo S. João 10, 11-18

Da penúltima página, De 25 ao Dia 1, passando pela página anterior, Sagrado e Profano e culminando aqui, esta citação do Evangelho Segundo S. João, subiu de nota de rodapé para o meio da página e, agora, encimando-a por fim.
A diferença entre fundamentalismo ou uma visão crítica e ainda que crente ou crente por maioria de razão que se tenha, reside nas leituras mais ou menos literais que dela, duma, desta citação, se façam.
Uma visão fundamentalista não admite outra senão a leitura, a interpretação que a essa visão a enforma e assim, ao que está escrito retira-se-lhe toda a riqueza que lhe subjaz e que a muitas outras leituras permite fazer, razão pela qual, aliás, essa citação perdura no tempo.
É para mim claro, convenhamos, que duma, desta citação não se lhe pode fazer tábua rasa do que está escrito nem, muito menos, tábua rasa do contexto em que é proferida.

A não se terem em conta quaisquer destes dois fatores, a letra de forma como o contexto, cai-se no relativismo puro e duro.
A terem-se, contudo, ambos os fatores em linha de conta, induz-se a essa mesma citação a relatividade sem a qual ela não seria inteligível.
Compreensível à luz da razão plural, ela só pode ser plural e tanto mais quanto prenhe de metáforas o for, de uma determinada época.
Escrevo, na página anterior e de passagem, sobre o equívoco das cruzadas.
Uma vez acontecido, dele não há como voltar atrás, equívoco histórico relativo, portanto.
Acrescentaria aqui que desse equívoco, ainda hoje estamos a pagar uma pesada fatura!
Não nos esqueçamos que, ao tempo das cruzadas, o mundo muçulmano florescia civilizacionalmente como não acontecia com o mundo cristão e que a pedra que este, então, ao primeiro lhe lançou lhe recai em cima, agora e de volta, em islamismo militante …

Mas vamos ao ponto:
Na minha ótica, Cristo não se pretendia erguer contra os outros:
Nem contra o Império, nem contra os Judeus nem contra fossem quais fossem as religiões, à época, vigentes.
Cristo rebelava-se contra, essa sim, a práxis social e religiosa acomodada então vigente, que se poderia transportar para os nossos dias e mesmo para o interior do próprio cristianismo.
Ao proclamar-se filho de Deus rebelava-se contra o estatuto divino, único do Imperador e afirmava a natureza sem exceções e universal da Humanidade no seu conjunto.
Nesta proclamação, logo que enorme impacto político!
Do mesmo modo, ao referir as outras ovelhas que pretendia reunir e que não pertenciam ao redil, falava daquelas que permaneciam tresmalhadas.
Tresmalhado ou que está separado dos outros, como acontecia, no mundo de então, com as mulheres e como pelos séculos fora e ainda hoje se verifica!
A Mensagem de Cristo era, já então, e pesem como pesassem todos os etnocentrismos que às sociedades as dominavam e, tanto mais quanto sob o jugo do Império, uma mensagem universal e, nesse sentido, radical:
As mulheres tinham, à data, no interior do Império como nas sociedades sob o seu jugo, um papel tresmalhado, separado daquele do mundo dos homens e por mais elevado que fosse o seu estatuto.

A Sua mensagem, tanto mais radical, atual quanto etnocêntricas eram as sociedades de então, etnocentrismo que ainda hoje, por todo o lado, permanece latente, assentava numa matriz axial tão mal ainda que justificadamente, à luz da História porque ela desenrolou-se assim e não de outra maneira, interpretada ao longo dos tempos:
Revisita-te a ti mesmo e não apontes o dedo ao Outro, diria.
Ou, não caias na tentação de ver no Outro ou nas outras culturas o mal que a ti próprio ou à nossa a dilaceram e que numa fuga em frente do Outro, estando em nós, somos levados a querer extirpar e mesmo se de crentes se tratarem embora na nossa religião não se revendo.
Revisita-te a ti mesmo, individualmente considerado ou na cultura em que te integras e nesta, repito, à época, as mulheres, essas sim, eram ovelhas completamente tresmalhadas.
E ainda que, subliminarmente, porque esta minha possível leitura também está lá e pesem todas as demais interpretações, porque linhas tortas a História não se escreve (!), tendencialmente, por avanços e recuos, se vá caminhando para um estatuto de igualdade sem que este signifique, muito antes pelo contrário, o fim da História.

E não apenas entre nós!

Mas entre nós, a prevalência da ambiguidade de que escrevo é um perigoso impasse que à regressão pode conduzir:
Tanto à regressão social como ao tresmalhar do próprio rebanho!


Deus escreve direito por linhas tortas e a Igualdade, na Liberdade, é a Sua pedra de toque
 

 

Jaime Latino Ferreira
Estoril, 4 de Maio de 2012

2 comentários:

manuela baptista disse...

que sim!

e

quanto mais sério o tema, mais a imagem me recorda "Tacones Lejanos" de Almodovar :)

o sagrado habita com o profano e riem-se

Jaime Latino Ferreira disse...

MANUELA BAPTISTA


... e quando se riem a Humanidade cresce!


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 6 de Maio de 2012