sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

TRIANGULAÇÃO


Vieira da Silva, La Ruée des Losanges, 1947



I

( eu, eu mesmo )

Olhe-se para aqui, quer para o mural do meu facebook como para este meu blogue e veja-se:
Desmultiplico-me em palavras adicionando-lhes música a elas, tanto quanto o possível, conforme, sem calculismos e constato ser uma nódoa económica!
Não manufaturo nem efetuo transações incapaz de me enquadrar nos cânones vigentes, não consigo amealhar, tão pouco e desdobro-me por aqui sem pré-condições negociais ao arrepio do mundo e vou permanecendo entre o sonho e a realidade numa teimosa convicção alimentada do que escrevo em aparente e pueril ingenuidade constrangedora.
Em que é que contribuo para o PIB?
Em que é que contribuo para a riqueza coletiva?
Em que é que acrescento mais-valia?
Sou uma nódoa!
Sou uma desgraça singular!
Ancoro-me em palavras nas suas triangulações, na musicalidade que transpiram e quem me dá crédito?

II

( o outro ou o conjunto de nós, Deus )

Sou uma nódoa económica!
Deixa lá, não vês que sem a palavra nem Deus, eu próprio, na minha relação contigo, existiria?
Seríeis máquinas, nem números, apenas bits, impulsos, programações sem autodeterminação.
Se não fossem as palavras, em si mesmas imagens que vos ajudam a construir o mundo, o que seria de vós?
São os conceitos que dão origem às coisas materiais ou estas que dão origem aos conceitos?
E as coisas materiais, transformam-se ou não, elas próprias, por via e ação dos conceitos?
Ou, dito de outra maneira, foi a roda que deu origem ao conceito ou a sua ideia, conceito em si mesmo, que deu origem à roda?
Roda, o que seria da construção do mundo sem o rasgo do seu conceito?
Onde estaríeis agora?
E o triângulo, quanto não movimenta ele pese embora a sua estrutura atrítica que a música, sua roldana, roda, engrena e suaviza?
Eu próprio, que seria da minha relação, elo, link contigo mesmo, se não me tivesse encarnado na própria palavra em triangulações que transbordam de todos os textos sagrados?
De todos, repito.


III

( o outro eu, o meu próximo igual )

- Sou uma nódoa económica!
- Eu não te dizia para não te martirizares!?
- Mas quem te diz que me martirizo, não vês que a palavra me alimenta?
- Mas se és uma nódoa económica e até à exaustão insistes afirmar sê-lo, de que enorme insignificância te revestes tu!?
- No princípio era a palavra, insisto!
- Então, de que te queixas?
- Eu não me queixo, assumo-o, sou uma nódoa económica e nem por isso deixo de ser quem sou: tu próprio não me interpelarias se eu não afirmasse ser como sou, justificando-te.
- Não me digas, era só o que faltava se pelo conceito, então, foste tu que me criaste?
- Não ponhas na minha boca coisas que eu não disse: tu realizas-te economicamente mas tal facto, essa é que é essa, não invalida que nem todos o consigam, pela sua própria natureza, realizar-se dessa forma. Nada é só economia, é esse o meu irónico ponto pelo que não é a economia que nos cria e dá pleno sentido. Se assim fosse, volto ao início, não passaríamos de números absolutamente descartáveis que o não somos.
- Mas, concedes-me espaço?
- Claro que te o concedo e nem te o teria de conceder. Quanto, reconhece, na sociedade que sem números também não seria reconhecível, eles também constroem, não te é, até ao paroxismo, concedido? Dá-me é tu espaço à Cultura!
- Cultura, mas não tem números a Cultura?
- Tem, claro que tem, mas nela, em infindáveis triangulações, o próprio triângulo se estrutura em números, ao ângulo da lógica somam-se aqueles da razão e dos sentidos dos quais a música, os sentidos, ela própria e tal como a palavra, a razão, irreconhecíveis sem o ritmo e, logo, sem os números, são o seu santo óleo.


prosaica definição aplicada de trindade santíssima com outras triangulações entrecruzada



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 22 de Fevereiro de 2013



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

UMA SIMPLES METÁFORA E UM DIÁLOGO PROFÍCUO





METÁFORA


Sendo certo que o ritmo da Igreja não corresponde àquele da espuma dos dias nem tão pouco ao ritmo singular da vida de cada um de nós já que, se assim fosse, ela não teria sobrevivido como a instituição milenar que é e ainda a propósito do meu post anterior, aqui fica, agora em destaque, esta simples metáfora:

Quando não se querem ver as ovelhas tresmalhadas não se podem arrebanhar e trazer todas, de uma só vez, ao redil.
É preciso estabelecer prioridades, apaziguar umas, primeiro, aquelas que mais ameaçam a integridade do rebanho e depois, só depois, pôr o enfoque nas outras dando-lhes a devida atenção e merecimento.
Quando a todas se quer reconciliar em simultâneo, corre-se o risco de perder quer umas, quer as outras tresmalhando, de vez, todo o rebanho.


DIÁLOGO

PMA - Uma outra metáfora: Passado algum tempo, Deus pôs Abraão à prova, dizendo-lhe: “Abraão!” Ele respondeu: “Eis-me aqui”. Então disse Deus: “Tome seu filho, seu único filho, Isaque, a quem você ama, e vá para a região de Moriá. Sacrifique-o ali como holocausto num dos montes que lhe indicarei”.


JLF - Meu Caro, não faças batota e, então, não deixes a metáfora a meio:
A batota é a mãe de todos os fundamentalismos e podendo seres muitas coisas, fundamentalista é que tu não és. Isaque, numa prova de fidelidade a que Deus sujeitou Abraão, foi poupado e a descendência de Abraão, pesasse embora a sua idade avançada, multiplicou-se por toda a Terra.
Abraços, meu excelso provocador nato, mas ainda bem que me provocaste porque o esforço a que me obrigaste não foi inglório.
Safado!

PMA - Mais que uma metáfora é uma dúvida sobre a eleição papal que, como sabes, é feita por inspiração do Espírito Santo, sendo pedido ao eleito, por Deus, um sacrifício …

JLF - Com certeza … e desde quando é que o exercício do Ministério não é, em si mesmo, um sacrifício ou uma cruz sendo certo que, como nunca, a apontar, tendencialmente, aos mais fracos e debilitados de nós como a sua própria resignação, aliás, sinaliza!?
Espírito Santo ou eu, o Outro e o outro eu, plasmados em Trindade Santíssima, assim o resumiria eu!
Especificando: eu, eu mesmo, o Outro ou o conjunto de nós, Deus, se quiseres, e o outro eu, o meu próximo igual!
Meu Caro,
Desculpa-me mas voltemos à citação que tu próprio, interpelando-me, truncaste conferindo-lhe uma certa ambiguidade o que me terá deixado um tanto confundido:
A metáfora nela incluída, sem truncagens e aplicada à Igreja no seu processo histórico e pesem embora todos os sinais contraditórios, tomando a Igreja, lato senso considerada, por Abraão e Isaque como cada um dos seus constituintes, também lato senso considerados ou todos nós, o que sugere, isso sim, é que por maiores que sejam as provações a que esta ou estes estejam sujeitos, em vez de se acantonarem, confinarem ou contraírem, pelo contrário, em sinal de abertura, se deverão expandir, em suma, abrir e desculpa-me o pleunasmo.
Afinal, tal como este nosso profícuo diálogo!

PMA - Claro!


ao meu Amigo PMA sem o qual este diálogo não teria sido possível e a quem lhe pedi autorização para aqui o editar, publicado e desenvolvido que foi, em primeira mão, no mural do meu facebook sendo certo que ao sacrifício, Deus, mesmo se com ele nos põe à prova também a ele nos sabe poupar



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 20 de Fevereiro de 2013



sábado, 16 de fevereiro de 2013

UM PODEROSO SINAL


brasão de Bento XVI




Para lá de toda a especulação que, por ora, se instalou, para lá de se acreditar ou não em Deus já que não é por esse facto que o poder da Igreja deixa de ser aquele que tem e para lá, ainda, da separação entre o poder temporal e o intemporal pela qual estritamente zelo e isto independentemente de se acreditar ou não Nele, que acredito, para lá, por fim, de se estar ou não de acordo com o seu pontificado e de nos revermos ou não nele, facto insofismável é que a resignação aprazada de Bento XVI, constitui, em si mesma, um poderoso sinal, tanto mais quanto simbólico, que se virá a refletir, a prazo e como sinal de abertura, a todos os níveis e em escalada em toda a cadeia social.
Bento XVI declarou, em Latim, a língua residual do Império e a universal da própria Igreja, ir resignar no próximo dia 28 de Fevereiro.
Nunca em tais condições de normalidade aparente da vida da Igreja, friso, tal terá, senão por uma vez, acontecido.

À agonia pública de um papa, pungente que o é e que, tendencialmente, tanto mais quanto nos tempos mediáticos que vivemos, subverte a própria centralidade de Cristo na vida da Igreja, com este seu gesto, o Papa Bento XVI vem contrapor, contrariando-a, qualquer tentação que, no futuro como no seu próximo passado aconteceu, pudesse vir, objetivamente, a induzir.
O Papa Bento XVI, na plena posse das suas faculdades e num gesto de desapego, retira-se dando lugar a outro, com outras energias e capaz de fazer face aos desafios que à Igreja se colocam neste início do terceiro milénio depois de Cristo.
Não me cabe a mim fazer quaisquer vaticínios mas os desafios são enormes, esmagadores mesmo e tanto mais quanto a vertigem dos tempos que correm e que o próprio Papa sublinhou.
De novo se instalará, ele já se instalou, o circo mediático a tentar condicionar o perfil do seu sucessor sendo certo que a ele, a esse circo, como instituição teocrática que a Igreja o é, lhe não caberá, sobre ele, decidir.

Para os católicos o Papa é o Papa e a sua palavra, concorde-se ou não com ela, tem força de lei mas o Papa não é o imperador, ele mesmo à luz dos cânones e preceitos da época mas utilizando terminologia cristã, Deus encarnado e, portanto, isento de fragilidades.
E essa ideia, no ato da sua resignação, humanizando-o, ao Papa, com este seu gesto também se reforça.
Escreve, a dado passo da sua declaração, Bento XVI:

( … ) “Todavia, no mundo de hoje, sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor este, que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado.” ( … )

Que reconhecimento de humildade para mais vindo de quem vem e tomado na posse da sua plena consciência e liberdade, nas encruzilhas que dilaceram a Igreja.
Porque a dilaceram mesmo.
Quem estará em condições de lhe suceder?
Fútil especulação.
Fica, no entanto, a dúvida se, atendendo à sua estatura intelectual, não terá sido esta também a maneira que Bento XVI encontrou, conotado, quiçá levianamente, como sendo um conservador mas tendo-as a elas, às alas mais conservadoras da Igreja e isto já para não carrear para aqui outras e inomináveis matérias, apaziguadas consigo, para derrubar muros, os muros que faltam, agora dentro desta instituição milenar, os principais inimigos da Igreja não são do exterior, tê-lo-á noutra circunstância afirmado, anquilosada à imagem de uma certa Europa envelhecida e decadente, mantendo-se como sua referência incontornável e tutelar que o não deixará de continuar a ser e para a refrescar, em novo impulso, do espírito conciliar de que foi um dos mentores e teóricos, agarrando decididamente o futuro que mais e mais tem vindo, progressivamente, a escapar à Igreja, rematando assim o seu pontificado num último ato genial da sua gestão.


o futuro não se faz sem o passado mas o passado não pode obstruir o futuro



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 16 de Fevereiro de 2013



quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

1000






Completam-se hoje as mil páginas de originais deste meu blogue.
Tudo, repito, originais.
Pouco mais de quatro anos passaram à média de duzentas e cinquenta páginas por ano.
Quatro anos, mil páginas, posts e cento e onze mil visitas de acordo com a estatística do meu blogger.
Não no que consta do contador situado em baixo, no meu blogue, que apenas foi instalado cerca de um ano e meio depois de a ele lhe ter dado início.
Aproximadamente cento e onze mil visitas desde a sua criação, vinte e sete mil setecentos e cinquenta visitantes por ano ou setenta e seis visitas diárias uma vez feita, por alto, a média.
Não é mau, convenhamos.

Que dimensões nele, neste meu blogue, já percorri?
Perco-lhes a conta.
Mas não faz mal.
Não faz mal porque o fio condutor que me orienta, diarístico, autobiográfico e consequente que o é, em contagem decrescente ou crescente consoante as perspetivas de que se parta, ele próprio se encarrega de as ir desvendando, dando-lhes corpo.
E quanto à densidade do que escrevo, o que poderei acrescentar?

Se atendermos a todos os factos atrás mencionados, ao critério musical nele seguido, aos não menos e rigorosos critérios que me obrigam ao distanciamento, a não ceder ao diz que diz-se, à demagogia ou ao populismo, julgo, e ainda aos factos adicionais de não ser movido pela criação de qualquer tipo de redes que com grupos de interesses ou outros se possam, tão pouco, confundir, não se pode dizer que os resultados estatísticos aqui mencionados e a que, por ora, cheguei se possam considerar despiciendos.
Mil páginas.
Balizado nestes meus inabaláveis critérios, assim farei por continuar, persistentemente, a prevalecer.
Bem hajam, Vosso e sempre!




Jaime Latino Ferreira
Estoril, 13 de Fevereiro de 2013



terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A 1






Uma folha A1 seria pouco para descrever o meu amor por ti.
Seria mesmo muito pouco.
Talvez todo o tamanho virtual deste meu blogue não fosse, ele próprio, suficiente para te o descrever.
Talvez não … seguramente que não.
Uma folha A1 é um lençol, lençol de folha, bandeira desfraldada ao vento.
Outonal, uma folha A1 cobre, no entanto e atapetado, o nosso chão.
Quantas folhinhas A7 nele caberiam?
E por aí fora em contagem decrescente até chegar a esta alvura branca, planura de paz e que poderia continuar, indefinidamente, a desdobrar-se.
Quantas?
Pesem embora todos os crescentes constrangimentos que nos afligem, neutralizando-os, quantas mais folhas para dizer quanto te amo ensurdecendo o garrote que nos flagela?
Lanço as minhas folhas ao vento na virtualidade que o não conhece mas que as difunde na estática imaterial da realidade.
Lanço-as.
Lanço-as para que o mundo inteiro saiba quanto te amo.
Se eu não te soubesse amar a ti que tudo mereces, como poderia eu amar os outros, o mundo?


A7, A6, A5, A4, A3 e A2


miniaturas, contagem decrescente 7



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 12 de Fevereiro de 2013



segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

A 2




Num poema se diz tudo sobre o amor
quanto mais se cresce a folha que o descreve
abre-se o botão e garrida a flor
ao seu perfume o exala como água que ferve

Nele o que se escreve ao mundo pede
em contraponto da guerra e da dor
um cântico que mais alto se eleve
na chama do constante nosso ardor

Derrete o gelo e abre-se em calor
assim é o amor no seu esplendor
é justo em tudo aquilo a que se atreve

Aprova tudo o mais que assim o serve
reprova tudo quanto se prescreve
o amor é o arco-íris num andor


miniaturas, contagem decrescente 6



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 11 de Fevereiro de 2013



domingo, 10 de fevereiro de 2013

A 3





A minha folha a crescer
sem deitar nada a perder
tudo te quer sempre dizer
sem nunca mais se esquecer

Desfraldo-a em bandeirola
que trago na minha sacola
ignição que não se isola
e que salta da cartola

Quanto disse desenrola
desgaste da minha sola
e o que não disse me assola
gruda-se a mim como cola

Tudo o que queria ser
não era mais do que ter
o teu amor sem esquecer
o mundo em que se rever

Como poderia viver
sem ti no nosso saber
o que de mim se descola
repetida rima controla


miniaturas, contagem decrescente 5



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 10 de Fevereiro de 2013



sábado, 9 de fevereiro de 2013

A 4






De A7 a A6, a A5 e até chegar aqui.
À folha de carta.
Uma carta de amor.
Uma carta de amor onde te digo tudo e nada.
Tudo o que sempre disse e mais ainda no meio de tudo o que sempre fica por dizer:
Que não consigo viver sem ti e sem os teus mil e um encantos, sem a tua sedução.
Artes, afetos.
Dia após dia neste nosso abençoado bem-estar.
Neste nosso saber viver.

Meu amor,
Sem ti …
Sem ti nada seria porque sem ti definharia.
Sem ti, neste casulo que se reconstrói todos os dias numa metamorfose permanente que se transforma em crisálida e abre, voa para o mundo.
Que a ele se dá todos os dias.
Sem descanso ou apenas com aquele onde em ti repouso para recomeçar tudo outra vez.
Sem ti que seria de mim?
De mim em tudo o que te contei e que assim, logo no nosso longo e reflexivo envolvimento, aos dois, nos predispôs.
Sem ti.
Ó meu Deus, que seria de mim sem ti?


miniaturas, contagem decrescente 4



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 9 de Fevereiro de 2013



sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

A 5




Mais a desdobro e me espanto
à folha no seu encanto
é como o amor que se abre
e dá mais sem que nos farte

Fértil no que quero dar-te
desenrola-se qual manto
em tudo o que dá e reparte
ecoa num simples canto

Soa mais alto que o pranto
que em nós sangra e num aparte
louvo o amor e o levanto

Amor não deixes de parte
o sofrimento a um canto
na força da nossa arte


miniaturas, contagem decrescente 3



Jaime Latino Ferreira
Estoril, 8 de Fevereiro de 2013