quarta-feira, 2 de maio de 2012

SAGRADO E PROFANO

de um cartaz alusivo ao Dia Internacional da Mulher, Jornadas do Parlamento Europeu, 8 de Março de 2012



Se, é certo, zelo e mesmo ou por maioria de razão se sendo crente, pela separação entre a Igreja e o Estado como da minha produção se poderá constatar, quererá tal facto dizer que sagrado e profano são estanques entre si?
Que tudo, no universo, não se religa com tudo ou é interdependente?
Que não dependemos uns dos outros?
Nem de propósito, na página anterior, De 25 ao Dia 1 e por ocasião da celebração de um feriado laico ou civil como o é o 1º de Maio, ao poema que a constitui aduzi-lhe uma citação do Evangelho do Domingo que o precedeu, do dia 29 de Abril e que aqui, ousadamente, quer partindo de uma perspetiva laica como religiosa, retomo e decidi, de novo, invocar, a saber:

 ( … ) tenho ainda outras ovelhas que não são deste redil e preciso de as reunir; elas ouvirão a minha voz e haverá um só rebanho e um só Pastor. ( … ) do Evangelho segundo S. João 10,11-18

Abordemos a sua oportunidade de uma perspetiva estritamente histórica recuando, para tal efeito, dois milénios:
No microcosmos etnocêntrico e tanto mais quanto sob ocupação do Império em que se desenrola a vida de Cristo, etnocentrismo esse do qual, ainda nos nossos dias, essa região permanece refém, a que outras ovelhas se poderia Ele, literalmente, estar a referir?
Outros povos?
Talvez aqui o grande e paradoxal equívoco das cruzadas
No microcosmos fechado, repito e longínquo da globalização, em que a Sua vida se desenrola, não me parece!
Numa sociedade profundamente paternalista, de intérpretes quase exclusivamente masculinos a quem Ele, sobremaneira, se dirigia e nem de outra maneira, à luz do contexto histórico, o poderia ter sido, pesem como pesaram as exceções então heréticas e logo a começar por aquela da Sua própria conceção que, à época, no feminino, à luz da doutrina, são invocados, o seu redil, por quem poderia ser, senão por homens, constituído?
E se, de então para cá, observarmos a evolução histórica, com que acuidade maior, na desigualdade que nas sociedades mais desenvolvidas, ainda hoje, separa os géneros, não sobrelevam, no seu seio, essas ovelhas tresmalhadas, mal quistas e mal-amadas que, até certo ponto, continuam a ser as mulheres?
Para mais na ambiguidade que, ainda hoje, num mundo, hoje sim, globalizado, em relação a elas a Igreja conserva?
Logo não as admitindo, plenamente, na hierarquia ou a sociedade, no seu todo, impedindo-as objetivamente de aceder a redutos que permanecem exclusivamente masculinos?
Por que carga de água!?

Eu não sou nada de leituras ou interpretações literais dos Textos mas, certo é que os contextos históricos em que os mesmos se desenrolam, na sua relatividade e não confundamos esta com relativismo, não podem ser obliterados e sobre esses vai-se tendo um conhecimento crescente até por testemunharmos a desigualdade que, ainda hoje, entre mulheres e homens, pesem embora todos os progressos conseguidos e, voilá, paradoxalmente ou talvez não, coincidentes, em grande medida, com o mundo formatado à luz do cristianismo, teima, contudo, em persistir.
Ele há ambiguidades …!
Há ambiguidades que pesem todos os tacticismos que as poderão, cada vez menos, justificar e mesmo quando se tratando de uma instituição milenar como o é a Igreja ou por maioria de razão, na vertigem acelerada da História a que assistimos, num turning point incontornável, cada vez mais, nos interpelam e até ou sobremaneira no que toca ao revitalizar da Mensagem que a não ser decididamente assumido, a vai depauperando da sua imensa atualidade ou da sua acrescida universalidade.
E tanto mais quanto, à época, partindo Ela de um microcosmos tão etnocêntrico!

No contexto de crise em que vivemos levantar, uma vez mais e quantas o forem necessário, a bandeira de para trabalho igual, salário igual não contém, em si mesma, nenhuma heresia e, muito menos, irrealismo.
Ela não significa, necessariamente, aumento de salários antes a sua equiparação entre os géneros.
É, tão só, razão de elementar justiça no caminho que tarda em realizar-se, em preencher-se plenamente.
Dividido, aliás, o trabalho, ele também, nunca poderá ter a força que desejavelmente mereceria ou importaria que tivesse!


o sagrado é o eterno do profano


 

Jaime Latino Ferreira
Estoril, 2 de Maio de 2012

4 comentários:

manuela baptista disse...

é uma leitura que deita abaixo o paradigma masculino dominante

eu pessoalmente acho que o evangelho se refere aos não crentes e ao desejo de haver um só pastor e um só rebanho

mas

antes este redil católico, do que uma enorme pradaria fundamentalista nos países mulçumanos, pelo menos para mim, moi, je

Jaime Latino Ferreira disse...

MANUELA BAPTISTA


Minha Querida,

Talvez ensaio do que se seguirá:

Fundamentalismo é fundamentalismo e a esse, sem o especificar porque os há de todas as naturezas, dispensamo-lo bem!

Quanto às interpretações que das leituras se façam:

Pessoalmente, sublinhas bem!

Aí a riqueza da Mensagem que a muitas leituras as permite, à tua como à minha também.

Como melhor sublinhas a preferência que por este redil tens ou não foras tu, não apenas católica mas, pesem as desigualdades ainda patentes, mulher!

O que remete para o equívoco das cruzadas e que neste texto, de passagem, refiro ou para a tentação de vermos no Outro ou nas outras culturas o mal que a nós mesmos ou à nossa a dilaceram e que numa fuga em frente do Outro, estando em nós, somos levados a querer extirpar e mesmo se de crentes se tratarem embora na nossa religião não se revendo ...

Ao tempo das cruzadas a cultura muçulmana florescia!

Ainda hoje estamos a pagar a fatura do nosso próprio fundamentalismo, avesso à mensagem de tolerância de Cristo, sua matriz axial:

Revisita-te a ti mesmo e não apontes o dedo ao Outro, diria.

A ti mesmo, individualmente considerado ou na cultura em que te integras e nesta, repito, há época, as mulheres, essas sim, eram ovelhas completamente tresmalhadas.

Tresmalhado ou que está separado dos outros como pelos séculos fora e ainda hoje se verifica!

E ainda que, subliminarmente, porque a mensagem está lá e pesem todas as interpretações, porque linhas tortas a História não se faz (!), tendencialmente, por avanços e recuos, se vá caminhando para um estatuto de igualdade.

E não apenas entre nós!

Mas entre nós, a prevalência da ambiguidade de que escrevo é um perigoso impasse que à regressão pode conduzir:

Regressão social e ao tresmalhar do próprio rebanho!

Obrigado pela deixa que me deste


Jaime Latino Ferreira
Estoril, 3 de Maio de 2012

Hanaé Pais disse...

E a preferência deste redil, que segue um pastor do Bem.
Igualdade, igualdade, nem a todos convêm.
E aos fundamentalistas, que não tresmalhem o rebanho, perdiam a irmandade e a igualdade que em todos eles contêm.

Hanaé Pais disse...

Se da reflexão nasce a Luz, vejamos...

À luz do contexto histórico, muitos ficaram reféns.
Assim sendo corroboro o "grande e parodoxal equívoco das cruzadas."
Foi efémero.

E na luz da doutrina e no redil por alguns homens constituido,as mulheres limitam-se à função da maternidade.

Mal amadas?
Releve, releve, revitalize a ideia.
Mal amados?

Que na Mensagem, não exista a resiliência das palavras emparedadas.

Porque as mulheres (e como mulher que sou), são detentoras de qualidades excepcionais, que é urgente revitalizar.

Exorcizemos a retórica pastoral da Igreja e de alguns homens, que por Medo das mulheres, as votaram injustamente à fogueira e engrossaram as bibliotecas com o literário pífio, difamando-as, conspurcando, obscurecendo o seu real valor.
São hoje as mulheres que viram as costas e já podem proferir a palavra Não, mais não, já chega, já basta!Ou a palavra sim!

É um mamífero primata fêmea,muito sagaz e inteligente, que é mãe e é filha.

Homem/Mulher = uniaxial.

Diclinismo?
Talvez!

O sagrado é o eterno do profano, sim é verdade.

Vamos procurar mais igualdade e não deixar tresmalhar o rebanho.

Porque sendo todos filhos de Deus, somos todos irmãos, mas nem sempre a irmandade se mantêm unida.

Medos?
Talvez, porque entre a opção de um cobarde vivo ou um herói morto, é sempre a estúpida opção da vida.

Como disse e muito Bem as mulheres ERAM, ovelhas tresmalhadas, ERAM...
Estamos a melhorar e aprimorar a nossa "casta".

Obrigado por nos ter(às mulheres) num bom conceito.