Emil Nolde, Ungemalten Bilder, Rotgelbe Wolke
O que se escreve, explicitamente, é o que se escreve mas o que implícito ao que se escreve mas não escrito está, é outra coisa.
O que se escreve tem a força do explícito, do que se vê.
O que implícito ao que se escreve se inclui, tem a força acrescida daquilo que não se escreve e tem-na, a essa força acrescida, exactamente porque não se vê:
Depreende-se apenas, incluído no que se escreve sugere-se e em aberto, exactamente porque pode como não depreender-se ou sugerir-se sem que deixe de lá poder estar.
E sem que deixem de poder lá estar muitas outras coisas, daí a sua força acrescida, que não apenas aquela que nos é ou possa ser explicitamente sugerida.
Olhe-se para esta frase poética:
Há qualquer coisa maior que nos move
O que nos sugere, então, este verso?
Que há qualquer coisa de maior que nos move …
E que coisa é essa que, sendo maior, nos move então?
Causas …
Apenas?
Princípios éticos, convicções … Deus, por exemplo!
Voltemos atrás e escrevamos então:
Deus move-nos
Se tivesse escrito isto, apenas com aqueles que de Deus comungam os poderia, na sua força, fazer identificarem-se.
Todos os outros, deste verso ficariam excluídos!
Agora, qualquer coisa maior …!
Qualquer coisa onde se incluiriam causas, princípios éticos, convicções, a Deus não o excluindo mas que a Ele não se circunscrevesse, a quantos mais nelas os poderia levar a no verso se reverem?
E, pergunto-me, excluir-se-ão, causas, princípios éticos, convicções ou Deus, uns aos outros?
Negar-se-ão entre si?
Escondê-Lo-ei, a Deus e não O explicitando, envergonhada ou oportunisticamente?
Sempre aprendi não dever dizer, escrever, o nome Dele em vão, embora o seu professamento faça parte das minhas convicções mais íntimas e a elas tenho direito mas, se me tivesse limitado a escrever o verso na sua segunda fórmula, quantos dela, nas suas causas, princípios ou convicções os excluiria!?
Quanta força o verso não perderia e ainda que se alegue que Deus a tudo o resto inclui!?
Quanta exclusão, sem o querer, estaria a cometer!?
E há ou não qualquer coisa de maior que nos move a todos, crentes ou não crentes e da qual ou das quais todos partilhamos!?
Há!
E se as partilhamos, ainda que sejam apenas, apenas não, já é muito (!), causas, princípios éticos ou convicções, partilhando-as e para quem creia, ficamos ou não, todos (!), mais perto Dele!?
Na verdade, de que adianta professá-Lo se não agirmos, por causas, princípios éticos ou convicções, em consonância!?
E como, reparai, o próprio Deus, tornando-se explícito, neste contexto não definharia …!
Explícito, não se tornaria Ele demasiado pequeno, exclusivo e mesquinho!?
Há, há seguramente qualquer coisa de mais forte no que não escrevendo se escreve!
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 30 de Maio de 2011