no rescaldo de mais uma Cimeira da União Europeia e não assim tão a despropósito, uma reflexão sobre o falido paradigma das promessas vãs e da incongruência na palavra
De dois dos factores que aferem da legitimidade democrática de um determinado candidato ao desempenho de um cargo político, apenas um deles é tido, automaticamente, em linha de conta:
Aquele que resulta do escrutínio que deriva da aplicação do sufrágio secreto e universal.
Este é, como sabemos, uma incontornável ferramenta sem cuja aplicação, em rigor, não se pode falar de democracia representativa e em relação a ele, julgo, estamos conversados.
Mas ele há um outro factor que, normalmente, não é tido em linha de conta e, sempre que possível, com a força de lei de aplicação imediata que o primeiro tem, a saber:
O cumprimento das promessas feitas em campanha eleitoral!
Quem será que nos dias de hoje as cumpre e tanto mais quanto se agravam as perspectivas de crise generalizada quanto aquelas com que nos confrontamos e que levam mesmo ao desmoronar daquelas que eram tidas como conquistas irreversíveis e que a própria gestão política desregrada faz, quantas vezes, perigar!?
O escrutínio do incumprimento das promessas feitas, com igual força de lei e tal como o sufrágio secreto e universal, deveria, pelo exemplo, sempre que possível e de pronto, determinar o destino do político eleito por via deste último.
Até porque o incumprimento da palavra dada esvazia de legitimidade e, logo, de representatividade o próprio contracto estabelecido entre o eleito e o eleitor e já para não falar na abstenção que, à palma de tantas expectativas goradas, cresce ferindo, por si mesma, a legitimidade dos próprios sufrágios!
Dir-se-á que o sufrágio seguinte funcionará como a prova de fogo aferidora desse mesmo cumprimento ou incumprimento mas, entretanto …
Entretanto a memória esquece, a palavra desgasta-se, a confiança mina-se e o afastamento entre eleitos e eleitores acentua-se na erosão provocada por essa mesma quebra de confiança!
Confiança tão em tamanho défice e, estou em crer (!), raiz de tantos outros défices e dívidas por saldar …!
Entretanto e ainda, as campanhas eleitorais, nas dinâmicas circenses que geram, transformaram-se, desde há muito, em momentos propícios a tudo menos à verdadeira reflexão sobre aquilo que está em causa.
Nelas passa-se de tudo menos verdadeiro esclarecimento:
Oportunismo, demagogia, populismo, caciquismo, em suma, não uma campanha eleitoral austera, responsável, adulta e esclarecida mas, apenas, eleitoralismo no pior dos sentidos que a palavra possa ter …!
Quem se atreverá, interrogo-me, a contradizer-me!?
E assim se subvertem na forma como no conteúdo esses dois factores, a força da palavra e a expressão pelo voto sem os quais não se pode, em rigor, falar de Democracia e implementá-la de tal modo que seja contrariada a distância que se cava mais e mais entre eleitos e eleitores, situação que ajudará e de que maneira a explicar o ponto a que chegámos.
Com força de lei deveria passar a valer como já vale:
Por um voto se ganha e por um voto se perde!
Mas também:
Pela palavra dada se fica como, no seu pronto incumprimento, automaticamente, se põe o lugar à disposição!
Aí sim, abstendo-se os candidatos de promessas vãs e perpassado que fosse o debate de ética republicana, seria recuperada a confiança que aos políticos e a quem os elege, porém, ao arrepio da ética e esvaziando-se de confiança, os torna reféns da especulação que os cavalga!
Finalmente:
Diz a voz do povo que já ninguém acredita nas promessas dos políticos …
Assim sendo, porque insistem estes em continuarem, gratuitamente, a fazê-las!?
não se falta à palavra dada e muito menos, porque queima como fogo, quando esta é dada a uma criança
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Outubro de 2011
4 comentários:
diz o povo e digo eu
mas como também sou povo, dizemos sim!
no entanto,
sem promessas, não teriam discurso
e tudo o que está em causa não lhes interessa discutir
assim, não há discurso
por mim, daria graças
prefiro quem governe, a quem se perca em palavreado inútil e confiança, não tenho nenhuma
mas concordo com a ideia: palavra atraiçoada, podem dizer adeus
e quem restaria...?
Eu também nunca cumpro o que prometo.
Fico com focinho de santa e no mesmo instante estrago os sofás com as unhas, sou muito política.
miau!
Jaime
Meu amigo
Não é por acaso que o povo diz o que diz.
A decepção é cada vez maior, embora as expectativas nunca sejam muitas. Reservamos sempre uma esperança, é certo, que nunca se confirma. A palavra já não tem a força que outrora tinha e hoje,não se é menos digno por se quebrarem promessas...
Um beijinho
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