Eis que exponho aqui, torrencialmente, a matéria dos meus sonhos.
Organizada em letras, palavras, frases e composições em que se conjuga ela adquire a consistência da matéria que embora não seja física na dispensa do papel não prescinde deste suporte que é físico, na virtualidade que o caracteriza, nem tão pouco biológica mas contém vida, aquela que deriva da sua conjugada leitura, escuta e interpretação.
Logo uma palavra, a palavra amor, por exemplo, consulte-se um bom dicionário, nas antinomias que a ajudam a definir, contém viva a História toda ...!
Quanto mais tudo o que aqui escrevo conjugado na sua profusamente dinâmica interacção ...!
A matéria primordial dos sonhos é a palavra.
O pensamento não a dispensa ...
A linguagem da ciência também não pois sem ela, não nos interrogaríamos e a interrogação assenta, logo de início, na palavra.
A da arte e das letras também nela assentam e por maioria de razão!
Oiço uma música e ela transporta-me à palavra e já para não considerar a sua linguagem cifrada, como tal, palavra em si mesma;
Ou os sentimentos que se exponenciam e que têm, eles também, tradução verbal sem a qual seriam uma mescla indecifrável, irracional;
Oiço uma história e ela é palavra;
Quero perceber uma fórmula matemática ou responder a uma hipótese científica ...
Ou decifrar um sonho ...!?
E é sempre a palavra que à realidade a transporta a um outro estágio realizador que do sonho o aproximam.
A vida ...!?
Ela também é matéria do sonho e este vai-se, por distanciamento no pesadelo, ou aproximações e nestas tendencialmente, realizando.
A matéria dos sonhos somos nós que acrescentamos ao real e este, em si mesmo, não é traduzível ...
Expliquem-mo pois, ao real sem a palavra e ainda que com simples sinalética mimada, palavra em si mesma!
Como veríamos nós sem a matéria dos sonhos e sua liga de campeões que é a palavra realizadora!?
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Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Maio de 2009
4 comentários:
PERGUNTA
Existiria o sonho, a palavra sonho que o incorpora, sem o conceito que o traduz?
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Maio de 2009
PERGUNTA II
E o sonho, o conteúdo dos sonhos, o que seria ele sem o conceito que os define?
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Maio de 2009
O Peixe-Lua e a Menina Estranha
Uma noite um Peixe-Lua cansado de nadar, veio dar a uma praia de conchas e areia fina.
Soprava um vento frio e o Peixe para se aquecer acendeu uma fogueira, com muito cuidado, para não grelhar as suas próprias barbatanas e ali ficou a brincar com a areia quente e com as conchas, a fazer uma espécie de bolas de sabão, mas que não eram de sabão, eram bolas de vidro brilhante e transparente.
O Peixe-Lua sabia que tinha talentos, mas fazer bolas de vidro foi uma revelação!
As bolas de vidro subiam pelo ar levadas pelo vento, umas em direcção ao mar, outras pela terra dentro.
O peixe pensou:
”Será que algum pescador as descobre e as captura nas suas redes, como se fossem peixes como eu? Será que algum menino as cobiça e joga com elas como se fossem um brinquedo?”
Adormeceu docemente com a música crepitante da fogueira e assim não viu uma menina pequenina espantada com aquela noite especial, que em vez de estrelas lhe oferecia uma linda e redonda bola de vidro!
A menina, além de pequenina também era um pouco triste. Às vezes, os adultos não a compreendiam muito bem e diziam:
“Cada vez está mais bonita esta menina, mas é tão estranha!”
A bola era tão grande e maleável que a menina não teve dificuldade nenhuma em entrar nela e disse:
“Esta bola vai ser a minha casa secreta! Aqui guardarei os meus tesouros, aqui posso esconder-me dos meus irmãos, quando eles me baterem ou me puxarem os cabelos ou quando quiser faltar à escola”.
E todas as noites a menina viajava na sua bola de vidro, espreitando o mundo sem que ninguém a visse mas vendo tudo e todos com a nitidez das manhãs antes da chuva.
Nela guardava as coisas boas que possuía, as recordações que ia acumulando e que assim não se perderiam nunca e jamais seriam esquecidas.
Ao Jaime digo,
a Matéria dos Sonhos também é a memória das coisas e das pessoas que mantemos vivas.
Este texto foi escrito e dirigido à Isabel Venâncio a propósito da sua página "Dualidades",por isso pertence-lhe.
Mas a matéria dos blogues também tem a sua dualidade, eles são como a menina, um pouco estranhos...
Manuela Baptista
Estoril, 27 de Maio 2009
E O PEIXE SONHAVA
E se não fosses tu a pôr um peixe a sonhar que era uma bonita menina dentro de uma bola de vidro feita de palavras, matéria do sonho (!) e memória das coisas e das pessoas que mantemos vivas, nem a Isabel Venâncio nem eu, muito menos aqueles todos que nos lêem, ficaríamos a conhecer a bonita história que dá pelo nome de O Peixe-Lua e a Menina Estranha.
Obrigado, minha querida
Jaime Latino Ferreira
Estoril, 27 de Maio de 2009
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